A essas alturas vocês já devem estar cansados de ouvirem falar sobre o mesmo assunto. Aquele momento comovente, uma sensação espetacular, coroada olfativamente pelas essências do Sabonete da Mônica recendendo no ar: o (aaaarrgh !!!) amor, o romance, a paixão, o som da fraternidade, um dos exemplos mais visíveis da exploração sem ética das anomalias humanas.
Escrevemos sempre sobre isso, a toda hora, dizemos milhões de vezes que amamos, mas nós não amamos, nós apenas negociamos (ou vendemos) momentos de (aaaarrgh !!!) amor. Nós somos maus, odiamos a imperfeição, e esquecemos de um detalhe: pensar é importante, pessoal ! Isso nos diferencia das ervilhas e de quem lê livros de auto-ajuda.
Começo agora, então, uma breve teoria. Não importa que o (aaaarrgh !!!) amor, na nossa consciência, enfrente uma fase terrível. Sempre pensei que é ridículo atribuir à nossa geração ou a qualquer outra uma importância "transcendental", mesmo considerando todas as evidências. Como a mágica dos nossos dias pode realmente sobreviver se os super heróis do nosso tempo jogam a arte no lixo e nos proíbem de sentir ? Sentir, se acreditarmos, que a única certeza da humanidade é não possuir destino algum; ou sentir que a nossa geração ensina o (aaaarrgh !!!) amor ao próximo a agulhadas de heroína ou a tragadas de ervas daninhas. Sem interpretices, porque eu não estou aqui pra chorar as pitangas da geração coca-cola ou pra ficar questionando se eram os deuses astronautas.
Acorda, gente !!! O mundo gira. Não existe mais espaço (nem paciência) para brigarmos por atitudes mais espontâneas, inconformadas ou auto-destrutivas de acordo com o nosso tipo de roupa, classificação, rótulo, ideologia (alguém aí lembra o que é isso ?) ou fidelidade a modismos.
Jimi Hendrix, Elvis Presley, Brian Jones, Sid Vicious, Janis Joplin, Bon Scott, Jim Morrison, Keith Moon, Kurt Cobain... Coitados, eles não sabiam que há três coisas na vida que precisavam: respeito pela vida, bom funcionamento do intestino e um chapéu igual ao do Charles Chaplin. Eles não gostavam de gente ordinária, tinham acessos de nervos e conversavam com seus companheirinhos invisíveis. Pobre Kurt. Pobre Jim. Eles os arruinaram, confiscaram seus sonhos de grandeza, comeram-nos vivos. Nessas horas, ser idiota pode ser uma vantagem fabulosa.
Parada dura. Fica difícil saber se o que fazemos e escrevemos, tentando explicar todo nosso moralismo ganancioso, é brega ou sofisticado. Possivelmente as duas coisas. Mas nós nunca nos sentimos responsáveis. Nós somos bons meninos, nós dizemos não às drogas. Nós nunca nos envergonhamos de nos ajoelhar e rezar sempre que estamos numa enrascada ou coisa parecida.
Com os nossos vinte anos a tiracolo e nossos olhos de menino secos e brilhantes a custa de todo choro reprimido, construímos teses oficias que justifiquem nossa covardia. Falamos de (aaaarrgh !!!) amor sempre usando palavras excessivamente rígidas. Nos juntamos com os anti-racistas e as feministas de camisetas, os amadores de calcanhar sujo, nos seguramos nas mãos e cantamos desafinados "Soy loco por ti America..."
Nos deram chances de cumprir nossa função, de construir alguma coisa (e não importa que ainda não esteja claro o que é), mas não acredite em tudo que se ouve ou tudo que se lê. Nossos ouvidos já estão saturados de tantas armações, e nem toda cocaína do mundo vai mudar isso.
Que o mundo não deixe
nunca mais Kurt usar heroína. Que a comédia dos nossos dias
faça com que a próxima geração se pareça
menos remendada. Que uma debutante de cavalo branco atropele a falsa poesia,
a falsa paixão, o puro mau gosto dos nossos hábitos. E que
eu pense em alguma coisa ao deitar no banco de trás de uma limusine
para transar com uma adolescente. E o que eu pensarei será "graças
a Deus que eu sou eu !"
Vinícius Paiva
(membro da Juventude Revolução,
poeta siléptico,
detesta kibe cru e acha que um
dia a casa cai)
13/06/98
Carta à minha ex-sogra
(Ou "Depois de matar a jibóia,
jararaca deita e rola")
Mimosa ex-sogrinha,
O tempo é poderoso ! Ele já me proporcionou muitas alegrias, amém, várias passagens por bandas variadas, alguns troféus na prateleira do banheiro da minha modesta mansão em Beverly Hills, subúrbio de Hollywood (cada um representa um show feito de graça) e umas 10 (dez) namoradas, todas garantindo que eu fui seu segundo homem (bendito carnaval !). Também ganhei alguns inimigos, o que não me acrescentou muita coisa, pois, com alguns amigos que eu tenho, nem precisava deles...
Mas como eu falava antes, o tempo é poderosamente foderoso. Foi preciso 1/5 (um quinto) de século e muito sacrifício pra chegar até onde ninguém supunha (seja lá onde for isso), e agora que eu cresci e fiquei grande, como me pediram ontem, vou tentar ser menos "estrela" na hora de tocar. Tá bom. Reconheço que eu incomodo muita gente, principalmente aqueles que jamais ouviram falar de "Highway star", coitados.
Parece que eu continuo maldito até hoje, bendito só pra você, certo, mozinho ? É por isso que eu sinto tantas saudades suas, e da lontra da sua filha também. Muita coisa mudou de lá pra cá, aos poucos fui me profissionalizando na minha arte, mas ainda sou um amador. Sei que não sou nenhum artista, intérprete, ou coisa que valha. Nada tenho a ver (nem haver) com Carmem Miranda. Não sou português, não danço rumba e detesto banana. E admito, embora contrariado, que suas pernas eram um pouco melhores do que as minhas. Mesmo assim, a crítica até agora me foi favorável. Minha mãe, meu tio e minha avó gostaram muito dos últimos textos (também, o folhetim é de graça...) e nenhum dos meus alunos particulares levou bomba em física, e olha que tem hora que me aparecem uns caras péssimos de serviço !
Sabe, às vezes acho que eu trocaria tudo por mais alguns momentos com você e aquela vidinha de esbórnia e diversão contigo e com aquela vaca que você pôs no mundo. Aliás ela agora deve estar planejando ser mãe de 21 (vinte e um) filhos com o novo namorado dela (acertei, né ?), todos com aqueles nomes hebreus – Jacó, Samuel, Sara, Raquel, Isaak, Salomão, etc... Ah, essa mulher muquirana...
O novo namorado da sua filha continua se recusando a me receber na casa dele, mas eu vou visitá-lo sempre que posso. Já me soltou um Rottveiller em cima e, na última vez que lá estive, me deu um tiro no pé. Deve ser um cara bastante excêntrico, diferentão e tudo, mas com jeitinho acho que ele vai topar tomar um chope comigo (mas eu não bebo). Como escreveram pra mim no dia do meu aniversário, "cada pessoa é um indivíduo. Falô ? Parabéns por você não ser nada disso". Não entendi lhufas, mas deve ser por isso que ele não topa tomar o chope comigo.
Pois é, ex-sogra lindinha, a minha estabilidade está matando a galera de raiva. Já chateei muitos, muitos me chatearam, e perdi todo o dinheiro que inteligentemente investi na safra de caju do ano passado, graças a Jeová, que sabe muito dessas coisas. Não sei até quando dura essa maré, mas é uma pena que você não pode mais levar pela mão seu filho de 20 (vinte) anos recém completos, que há pouco tempo deixou de molhar a borracha na boca antes de apagar o nome escrito a caneta depois do ponto final (que não foi final).
Você sabe, eu não suporto mais ficar onde sou querido e respeitado, e ando meio amargurado com isso tudo. Eu sinto que é preciso dar uma virada na mesa. Já estou há duas horas nesse boteco e o garçon ainda não me destratou. Acho que eu preciso mudar de garçon, de bar, de vida. Posso pintar por aí ? Estou precisando de um trato seu. Espero ansioso tua resposta.
Seu eterno desempregado porno-fonográfico e realmente socialista, para sempre seu,
VINÍCIUS J. KEES Mc PAIVA
Fundador do clã – 1421
- 1521 D.C. (Depois da Copa) – em 11/08/1998